sexta-feira, 8 de junho de 2012

"África Livre" Guerra colonial portuguesa


                                 Guerra Colonial Portuguesa


Designa-se por Guerra Colonial, Guerra do Ultramar (designação oficial portuguesa do conflito até ao 25 de Abril), ou Guerra de Libertação (designação mais utilizada pelos africanos independentistas), o período de confrontos entre as Forças Armadas Portuguesas e as forças organizadas pelos movimentos de libertação das antigas províncias ultramarinas de Angola, Guiné-Bissau e Moçambique, entre 1961 e 1975. Na época, era também referida vulgarmente em Portugal como Guerra de África.

Ao longo do seu desenvolvimento foi necessário aumentar progressivamente a mobilização das forças portuguesas, nos três teatros de operações, de forma proporcional ao alargamento das frentes de combate que, no início da década de 1970, atingiria o seu limite crítico. Pela parte portuguesa, a guerra sustentava-se pelo princípio político da defesa daquilo que considerava território nacional, baseando-se ideologicamente num conceito de nação pluricontinental e multi-racial. Pelo outro lado, os movimentos de libertação justificavam-se com base no princípio inalienável de autodeterminação e independência, num quadro internacional de apoio e incentivo à luta.

Contexto político-social

Nas colónias europeias sempre existiram movimentos de oposição e resistência à presença das potências coloniais. Porém, ao longo do século XX, o sentimento nacionalista — fortemente impulsionado pelas primeira e segunda guerras mundiais — era patente em todas as movimentações europeias, pelo que não será surpreendente notar o seu alastramento às colónias, já que também muitos dos seus nativos nelas participaram, expondo o paradoxo da celebração da vitória na luta pela libertação, em território colonial, ainda submetido e dependente.
Ficheiro:Portuguese colonial war map1.PNG  - Províncias ultramarinas portuguesas em África no período da Guerra do Ultramar.
Por outro lado, também as grandes potências emergentes da II Guerra Mundial, os Estados Unidos da América e a União Soviética, alimentavam — quer ideologicamente, quer materialmente — a formação de grupos de resistência nacionalistas, durante a sua disputa por zonas de influência. É neste contexto que a Conferência de Bandung, em 1955, irá conceder voz própria às colónias, que enfrentavam os mesmos problemas e procuravam uma alternativa ao simples alinhamento no conflito bipolar que confrontava as duas grandes potências. Estas, eram, assim, chamadas a considerar com outra legitimidade as reivindicações do chamado Terceiro Mundo, quer para manter o equilíbrio nas relações internacionais da Guerra Fria, quer para canalizar os sentimentos autonomistas para seu benefício, como zona de influência. A influência externa nas colónias perdia a orientação meramente separatista e desestabilizadora, e caminhava para um efectivo apoio - ou entrave - nas relações com os países colonizadores.

No final da década de 1950, as Forças Armadas Portuguesas viam-se confrontadas com o paradoxo da situação política gerada pelo Estado Novo, que haviam implantado e sustentado desde 1926: por um lado, a política de neutralidade portuguesa na II Guerra Mundial colocava as Forças Armadas Portuguesas afastadas de um eventual confronto Leste-Oeste, por outro, aumentava, na perspectiva do regime, a responsabilidade na manutenção da soberania sobre os vastos territórios ultramarinos, onde a tensão do pós-guerra avizinhava lutas independentistas nas colónias da Europa Imperial. Contudo, os mesmos dirigentes que afastaram Portugal da luta pela libertação europeia, optaram por integrar o país na estrutura militar da NATO, num subtil desejo de se aliar aos vencedores, em detrimento da preparação para as ameaças nos espaços coloniais, que o próprio regime considerava imprescindíveis para a sobrevivência nacional.

Esta integração de Portugal na Aliança Atlântica iria formar uma elite de militares que se tornaria indispensável para o planeamento e condução das operações durante a Guerra do Ultramar. Esta "geração NATO" ascenderia rapidamente aos mais altos cargos políticos e de comando, sem necessidade de dar provas de fidelidade para com o regime. A Guerra Colonial estabelecia, assim, incompatibilidades entre a estrutura militar — fortemente influenciada pelas potências ocidentais, de regime democrático — e o poder político. Alguns analistas consideram que o chamado «golpe Botelho Moniz» marcou o início desta ruptura, bem como a origem de uma certa desconfiança do regime em relação à manutenção de um único centro de comando, perante a ameaça do confronto com a força armada. Esta situação provocaria, como se verificaria mais tarde, a descoordenação entre os três estados-maiores (Exército, Força Aérea e Marinha).

O regime do Estado Novo nunca reconheceu a existência de uma guerra, considerando que os movimentos independentistas eram apenas terroristas e que os territórios não eram colónias, mas províncias e parte integrante de Portugal. Durante muito tempo, grande parte da população portuguesa, iludida pela censura à imprensa, viveu sob a ilusão de que, em África, não havia uma guerra, mas apenas alguns ataques de terroristas e de potências estrangeiras.

Oposição

Contrariando o que o estado pretendia transmitir como sendo de consenso geral, isto é, que as colónias faziam parte da unidade nacional, os comunistas foram os primeiros a opor-se aos confrontos. Na verdade, a primeira organização a manifestar-se publicamente foi o PCP, em 1957, durante o seu V Congresso, pedindo a independência imediata, completa e indolor. Porém, a censura do regime obrigava o partido a representar dois papéis: o de partido político e o de força de coesão entre os sectores oposicionistas, com os quais acordava programas que não reflectiam as suas posições anticoloniais; seguindo a mesma linha de orientação, já assim se tinham manifestado, durante as eleições presidenciais celebradas durante o Estado Novo, onde era defendida essa unidade: Norton de Matos (1949), Quintão Meireles (1951), Humberto Delgado (1958), e mesmo os candidatos apoiados pelo PCP: Ruy Luís Gomes e Arlindo Vicente.

Depois da fraude eleitoral de 1958, Humberto Delgado formou o Movimento Nacional Independente (MNI) que, em Outubro de 1960, defendia a necessidade de preparar o povo das colónias, antes de lhe ser concedido o direito à autodeterminação. No entanto, nenhuma data ou metodologia foi sugerida.

Assim, a oposição ia-se assumindo lentamente, começando pelo estalar da luta armada, até se aperceber que o conflito estava a durar tempo demais. Em 1961, o nº 8 da Tribuna Militar tinha como título, "Ponhamos fim à guerra de Angola". Os seus autores estavam ligados às Juntas de Acção Patriótica (JAP), apoiantes de Humberto Delgado, responsáveis pelo ataque ao quartel de Beja. A Frente Patriótica de Libertação Nacional (FPLN), criada em Dezembro de 1962, contrapunha as posições conciliadoras. O sentimento oficial do estado português, contudo, mantinha-se: Portugal possuía direitos inalienáveis e legítimos sobre as colónias e era isso que era transmitido pelos meios de comunição e pela propaganda estatal.

Em Abril de 1964, o Directório de Acção Democrata-Social reivindicava uma resolução política e não militar. Em sintonia com esta iniciativa, em 1966, Mário Soares sugeria a preparação de um referendo sobre a política ultramarina a seguir por Portugal, e que deveria ser precedido por um debate nacional a realizar durante seis meses.

Nem a morte de Salazar fez com que o panorama político se alterasse. Só com as eleições legislativas de 1969 se viria a verificar uma radicalização da atitude política, nomeadamente entre as camadas mais jovens, que mais se sentiam vitimizadas pela continuação da guerra. As universidades desempenharam um papel fundamental na difusão deste posicionamento. Surgem, assim, as publicações Cadernos Circunstância, Cadernos Necessários, Tempo e Modo, e Polémica. É neste ambiente que a Acção Revolucionária Armada (ARA) e as Brigadas Revolucionárias (BR) se revelam como uma importante forma de resistência contra o sistema colonial português, dirigindo os seus ataques, principalmente, contra o Exército.

A ARA, vinculada ao PCP, iniciou as suas acções militares em Outubro de 1970, mantendo-as até Agosto de 1972. Destacam-se o ataque à Base Aérea de Tancos contra equipamento da Força Aérea, a 8 de Março de 1971, e o atentado contra as instalações do quartel-general do COMIBERLANT, em Oeiras, em Outubro do mesmo ano. As BR, por sua vez, iniciaram as acções armadas a 7 de Novembro de 1971, com a sabotagem da base da NATO de Pinhal de Ameiro, verificando-se a última a 9 de Abril de 1974, contra o navio Niassa que se preparava para zarpar de Lisboa transportando tropas para a Guiné. As BR chegaram, inclusive, a agir nas colónias, colocando uma bomba no Comando Militar de Bissau, a 22 de Fevereiro de 1974.

Também o alinhamento dos sectores da finança e negócios, classes médias e movimentos operários constituiu um importante ponto de inflexão na contestação à política do regime, em 1973. Apresentavam-se, agora, concordantes quanto à independência das colónias, poucos meses antes do 25 de Abril.

Antecipação casual

Ficheiro:Propagandalançadadeavião....jpg
A propaganda tornou-se uma forma de combate psicológico contribuindo para desorganização do inimigo.

A instrução dos quadros e tropas das forças portuguesas, por normalização da estrutura da NATO, concebeu a publicação de um conjunto de manuais intitulados "O Exército na Guerra Subversiva" que serviriam de suporte para a organização das tropas durante a Guerra. Introduziam também a necessidade da guerra psicológica que se revelaria como uma frente de combate sólida para Portugal. Com efeito, a "conquista das populações" foi aplicada a níveis tácticos e estratégicos com sucesso, exceptuando as dificuldades no início e fim da guerra.

Também se revelou fundamental a especialização de grupos armados, como os Comandos, único corpo organizado especificamente para esta guerra — desmantelado pouco tempo depois de esta terminar — e adaptação dos Fuzileiros e pára-quedistas. Quanto às unidades recrutadas no próprio teatro de operações, as tropas especiais africanas, os TE, GE e GEP, Flechas e fuzileiros foram adaptadas às técnicas de combate específicas deste tipo de cenário (guerrilha) e terreno. Porém, a quase sempre deficiente instrução dos efectivos implicaria uma crescente degradação da sua eficácia, a par com o cansaço e esvaziamento dos quadros permanentes.

Com o embargo internacional à venda de armas a Portugal, as forças armadas viram-se, a partir dos anos 70, ultrapassadas tecnologicamente pelos movimentos de libertação, o que foi especialmente notório na Guiné-Bissau. O défice seria provisoriamente suportado pela supremacia aérea, até à introdução dos mísseis anti-aéreos por parte dos guerrilheiros.

Conflito armado

Angola

Soldados portugueses nas matas de Angola.
Em Angola, a sublevação da ZSN foi efectuada pela União das Populações de Angola (UPA) — que passou a designar-se como Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA) em 1962. A 4 de Fevereiro de 1961, o Movimento Popular de Libertação de Angola reivindicou o ataque à cadeia de Luanda, onde foram mortos sete polícias. A 15 de Março de 1961, a UPA, num ataque tribal, deu origem a um massacre de populações brancas e trabalhadores negros naturais de outras regiões de Angola. Esta região seria reocupada mediante operações militares de grande envergadura que, porém, não conseguiram conter o alastramento das acções de guerrilha a outras regiões de Angola, como Cabinda, o Leste, o Sudeste e planalto central. Ao MPLA, que desempenhou um papel fundamental, há a acrescentar, a partir de 1966, a acção da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA).

Com motivações essencialmente tribais, e dirigidos de forma autocrática por Holden Roberto, a actividade da UPA caracterizou-se pela guerrilha rural, realizada por pequenos grupos armados, e pelo massacre de populações, como já se previa na sua primeira acção. Com catanas e algumas espingardas, os canhangulos, procuravam apoderar-se das armas das fazendas e postos administrativos atacados. Não manifestaram interesse em consolidar o domínio territorial, conseguido nos primeiros dias, nem foi apresentado qualquer programa político.

Em Angola, os efectivos militares contavam, no início de 1961, com 5000 militares africanos e 1500 metropolitanos, organizados em dois regimentos de infantaria — um em Luanda e outro em Nova Lisboa (actual Huambo) — cada um com dois batalhões de instrução e outro de atiradores) e um grupo de cavalaria, sediado em Silva Porto. A densidade média era, portanto, de um soldado para cada 30 km². Imediatamente disponíveis para acorrer à zona afectada estavam apenas mil soldados europeus e 1200 africanos.

 Guiné-Bissau
Ficheiro:PAIGC posto de controlo.jpgNa Guiné, os confrontos foram iniciados, na perspectiva portuguesa, em Julho de 1961 quando guerrilheiros do Movimento de Libertação da Guiné (MLG) lançaram ataques às povoações de S. Domingos, Suzana e Varela, junto à fronteira noroeste com o Senegal.[4] Na perspectiva guineense, os confrontos iniciaram-se em Janeiro de 1963, quando o Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), sob a forma de guerrilha, desencadeou um ataque ao quartel de Tite, a Sul de Bissau, junto ao rio Corubal. Com a acção do MLG no noroeste, a partir do Senegal, e do PAIGC no sul, a partir da Guiné-Conacri, os ataques rapidamente se estenderam a quase todo o território, crescendo continuamente de intensidade, e exigindo um empenhamento proporcional por parte dos portugueses.

A guerra na Guiné colocou frente a frente dois homens de forte personalidade: Amílcar Cabral e António de Spínola, responsáveis pela modelação do teatro de operações na Guiné. Em 1965 dá-se o alastramento da guerra ao Leste (Pirada, Canquelifá, Beli). Nesse mesmo ano, o PAIGC realizou missões no Norte, na região de São Domingos, onde, até ao momento, apenas actuava a FLING, que se via a braços na luta, depois da OUA ter canalizado o seu apoio para o PAIGC. Este, em sequência da sua crescente afirmação internacional, viria a receber apoio militar cubano, que duraria até ao final da guerra.

Pode-se dizer que as forças portuguesas desempenharam, na Guiné, uma força defensiva, mais de manutenção das posições que propriamente de conquista das populações, limitando-se, de uma forma geral, a conter as acções do PAIGC. Por isso, esta época infligiu um grande desgaste para os portugueses, constantemente surpreendidos pelos guerrilheiros e pela influência destes junto da população que, entretanto, era recrutada para o movimento.

Com as decisões de António de Spínola, as forças portuguesas ganhavam um carácter mais ofensivo. Entre 1968 e 1972, sob o comando deste general, conseguiriam manter a situação sob controlo e, por vezes, levar a cabo acções de confirmação das posições estratégicas. Mais: agora lutava-se subversivamente, utilizando a manipulação propagandística que iria afectar os níveis mais altos da hierarquia do PAIGC. Porém, a situação pendeu rapidamente para o lado do PAIGC que, não obstante o assassínio de Amílcar Cabral, não diminuiu a actividade operacional.

Em Março, o aparecimento dos mísseis anti-aéreos Strela-2 (russo: 9К32 "Cтрела-2"; código NATO: SA-7 Grail), de fabrico soviético, obrigaria as tropas portuguesas a reavaliarem o esforço de guerra. Durante algum tempo, o suporte aéreo ficou, assim, indisponível, o que teve graves repercussões nas tropas, mesmo a nível psicológico.

Marcelo Caetano, em conflito com Spínola, dispensou o general do cargo de governador, que seria ocupado por Bettencourt Rodrigues a 21 de Setembro de 1973. Três dias depois, o PAIGC declarava a independência do novo estado, em Madina do Boé. Curiosamente, nem Spínola nem Bettencourt estavam no terreno durante esta ocorrência.

 Moçambique

Em Moçambique, o movimento de libertação, denominado Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), efectuou a sua primeira acção nos dias 24 e 25 de Setembro de 1964, num ataque a Chai, na província de Cabo Delgado, estendendo-se posteriormente ao Niassa, Tete e para o centro do território. Porém, um relatório do Batalhão de Caçadores 558 refere acções violentas a 21 de Agosto de 1964, na região de Cabo Delgado, como indica o relatório do Batalhão de Caçadores 558. O mesmo relatório refere que, três dias depois, um padre da Missão de Nangololo tinha sido ferido mortalmente. Estas acções foram atribuídas a grupos de guerrilheiros MANU e da UDENAMO.

A 16 de Novembro do mesmo ano, as tropas portuguesas sofriam as primeiras baixas no Norte de Moçambique, região de Xilama. A organização e armamento dos guerrilheiros evoluía rapidamente. Também o acidentado terreno, a baixa densidade das forças portuguesas e a fraca presença de colonos facilitaram a acção da Frelimo, que alargava a sua acção para Sul, na direcção de Meponda e Mandimba, mostrando intenção de ligar-se a Tete, atravessando o Malawi, que apoiou, nos primeiros anos, o trânsito e refúgio de guerrilheiros.

Até 1967, a FRELIMO mostrou-se menos interessada pela região de Tete, exercendo o seu esforço nos dois distritos do Norte, onde a utilização de minas terrestres se destacou de forma particular. No Niassa, a intenção da FRELIMO era simultaneamente criar uma zona livre, e uma zona de passagem para Sul, em direcção à Zambézia

Já em Abril de 1970, a actividade militar da Frelimo aumentou de forma significativa, devido à presença de Samora Machel em Cabo Delgado, onde apresentaria os planos de ofensivas a executar em Junho e Julho.

Até 1973/74, as atenções viravam-se para Cabora Bassa. Os últimos tempos de guerra caracterizaram-se pelo avanço da FRELIMO para Sul, registando acções na zona de Chimoio e agitação das populações de origem europeia. O general Kaúlza de Arriaga disponibilizava-se para continuar o comando, mas impunha condições que o Governo de Lisboa não aceitou. Terminada a sua comissão em Agosto de 1973, foi substituído pelo general Basto Machado. A situação continuaria a deteriorar-se até aos designados "acontecimentos da Beira", em Janeiro de 1974, quando as populações brancas de Vila Pery e da Beira se manifestaram contra a incapacidade das forças portuguesas de suster a situação, já esgotada de efectivos e sem possibilidade do reforço dos meios de combate.
                                                                                      Por: Antonio Carlos dos Santos


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http://pt.wikipedia.org/wiki/Guerra_Colonial_Portuguesa

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